Na folia com o Espírito
Santo, o Espírito Santo caprichou
Sinopse:
É chegado
mais um carnaval e novamente entro na avenida com a minha irreverência
de sempre. Quero levar ao meu povo um pouco mais de alegria em tempos
tão complicados, de tanta turbulência política. Vou seguir numa viagem
pelo meu querido Brasil. Passarei por terras ainda não manchadas por tanta
sujeira humana, se é que eles são humanos. Nessa noite minha preocupação
maior é com a folia e com essa gente sofrida e batalhadora que não merece
tanta maldade.
Ouço sons ecoarem, que vão me chamando. São tambores e casacas, um ritmo
gostoso se misturando aos meus surdos e tamborins, unindo o sagrado e
o profano. Esse encontro desperta nos homens uma sensação eufórica de
gozo, de contemplação da vida. A alma explode em cores e contagia a todos.
Estamos entrando num estado santo em plena folia. É o carnaval carioca
invadindo as terras de índios canibais que mostram sua força através da
cultura popular.
Espírito Santo. Um lugar de diversidades. Um estado singular. Ali nossas
almas são tomadas pelos espíritos " Goitacás" e " Botocudos"
, terríveis canibais que comiam seus adversários. O carnaval, legítimo
representante do antropofagismo cultural, devora culturas e delas monta
seu espetáculo. O homem se devora em busca de conhecimento e sabedoria.
A minha comunidade suburbana, agora aborígene, segue comigo com fome de
saber. Vamos devorando as nações que formaram esse povo tão especial,
são diversidades de raças que enriqueceram e deram origem ao homem capixaba,
cheio de mistérios e pluralidade. Um povo que se mistura a beija-flores
e orquídeas protegido pela força da padroeira Nossa Senhora da Penha.
Oh, Espírito Santo! Tu és naturalmente belo, sua mistura de lagoas e cachoeiras,
mangues e dunas, montanhas e praias nos encantam. Estava nas montanhas
e o frio congelava minha alma, precisei recorrer a vinho e polenta para
me aquecer. Em quarenta minutos cheguei às praias e a visão do litoral
me fez delirar. Sua geografia foi abençoada pelo Divino.
Passeando por suas cidades fui conhecendo o folclore capixaba tão bom
de se ouvir, de se ver e de sentir. Sua força é sua gente, que é quente
e busca na raiz do passado suas origens. De geração em geração, assim
o povo vai modelando as tradições do Espírito Santo.
Na travessia do seu litoral avistei portos e vi produtos dessa terra sendo
levados ao mundo. Não são mais piratas e corsários, mas sim o progresso
que faz a economia prosperar em meio a guindastes e ferragens de gigantescos
navios. Temos orgulho do nosso mármore e granito.
Do barro, do amor, da sensibilidade. Assim é a origem do belo artesanato
capixaba. Sua culinária é colorida com influências negra, branca e com
uma pincelada de vermelho dos índios. Sua culinária tem "Espírito",
e o sabor é "Santo". Dos manguezais sai o barro que nas mãos
de artesãs se transforma em panelas de origem secular. Nelas preparam-se
moquecas e diversos pratos apetitosos à base de frutos do mar.
Em Vila Velha deparo-me com a
força do chocolate. Tento devorá-lo, mas
sua força é maior. Caio na sua fúria e deixo-me ser devorado por essa
delícia marrom que se fixou nas terras capixabas aos pés da padroeira.
O tambor, a casaca , o coração. Tudo isso bate mais forte no Espírito
Santo. Ouço sons de lamentos em forma de canções. São verdadeiras orações
louvando a São Benedito. Vejo um povo festeiro invadindo as ruas com as
bandas de congo. Mascarados, fiéis, romeiros misturam-se ao povo e irmanados
formam uma única corrente de fé.
A alegria sagrada invade minha alma e peço a São Benedito que ilumine
o caminho da minha comunidade suburbana tão sofrida. A festa de alma profana
curva-se ao sagrado numa expressão de fé.
Na folia vamos desfilando com o Espírito Santo e manchando a passarela
de forma multicor! Em busca de um "Santo Espírito" vamos deixar
a folia levar nossa alma em busca de felicidade.
Abram seus espíritos à inspiração e como verdadeiros canibais indígenas
devorem esse estado santo que tanto tem a oferecer.
Chico Spinosa |